“Assim como as crianças precisam de treinamento, os pais também precisam ser treinados. O treinamento consiste em aprender novas respostas às provocações das crianças, e que pode levar a novas atitudes e abrir novos caminhos onde florescem relacionamentos harmoniosos.”
Rudolf Dreikurs (1)
Pedagogos, psicólogos e pediatras estão sempre estudando e desenvolvendo teorias e métodos que ajudem no desenvolvimento infantil e na melhoria da qualidade de vida e relação entre pais e filhos. Nesse contexto surge a Disciplina Positiva, uma metodologia de educação que tem como princípios a psicologia da criança, seu comportamento, desenvolvimento e independência. A criança não é um adulto pequeno, seu corpo, mente e raciocínio funcionam de forma própria e por isso são necessários mecanismos próprios para crianças. Aquilo que funciona com adulto não funciona com criança. Assim, a disciplina pode ser ensinada com firmeza e gentileza ao mesmo tempo, sem punição, castigo ou recompensa. Esta filosofia apresenta o caminho do meio entre o autoritarismo e a permissividade, resultando em mais de 50 ferramentas para nos ajudar a desenvolver as habilidades que tanto queremos para construir relacionamentos mais saudáveis.
Em primeiro lugar, é importante reforçar o que significa disciplina. Segundo o dicionário, disciplina pode ter duas definições: 1. Obediência às regras, aos superiores, aos regulamentos; 2. Ordem, regulamento, conduta que assegura o bem-estar dos indivíduos ou o bom funcionamento (p.ex., de uma organização). A disciplina positiva diz respeito a segunda definição, ou seja, não é uma forma de obediência cega, mas sim implementação de ordens e regras de conduta que são importantes para o convívio social.
A disciplina positiva, então, busca desenvolver melhores técnicas paras os pais criarem os filhos sem efeitos negativos e gerando o mínimo de dor e o máximo de resultado possível. Na verdade, no contexto da disciplina positiva, o ato de disciplinar é uma forma de educar e dar limites, mas sempre associado ao afeto, ao diálogo e ao respeito à criança.
Sendo assim, a disciplina positiva elimina da educação infantil os atos de impor limites à base da coerção ou chantagem emocional, de ignorar a criança e suas necessidades e também nega a permissividade, onde a criança fica sem limite. De forma geral, o sistema proposto pela metodologia positiva é o de prezar pelo desenvolvimento integral (social, afetivo, cognitivo, motor) das crianças, impondo limites necessários, mas de forma solidária, gentil e significativa.
Princípios da Disciplina Positiva
O mais importante é considerar que uma criança, quando apresenta um comportamento inadequado, está passando por um desafio e/ou não consegue lidar com algum problema, sentimento ou frustação que a incomoda. Com essa visão em mente, a criança precisa de apoio, colo e da validação de sentimento e tem que ser tratada com o respeito para que se sinta segura para aprender a lidar com o desafio que a incomoda.
Isso não significa que exista um manual ou um livro de receitas sobre como criar os filhos, afinal cada criança e cada família é única. Porém existem ferramentas que ajudam a moldar um relacionamento saudável.
A disciplina positiva segue cinco fundamentos que devem ser ensinados na educação dos filhos, são eles:
- Ajudar a criança a se sentir conectada: a criança deve sentir que pertence à família/escola e sentir que é capaz de contribuir;
- Encorajar respeito mútuo: ter firmeza e gentileza ao mesmo tempo. Os adultos tornam-se o modelo de respeito;
- Ser efetiva à longo prazo: considerar o que a criança está pensando, sentindo, aprendendo e decidindo sobre si mesma e sobre seu meio social – e sobre o que fazer no futuro para sobreviver ou para prosperar;
- Ensinar habilidades sociais e de vida: ensinar a ter respeito, cuidado com os outros, resolução de problemas e cooperação;
- Incentivar a descobrir suas capacidades: encorajar o uso construtivo do seu poder pessoal e desenvolver a sua autonomia.
Habilidades Desenvolvidas pela Disciplina Positiva
No livro da autora Jane Nelsen(2), são destacadas 7 habilidades de vida e sociais que ajudam crianças a se tornarem pessoas capazes.
- Forte percepção das habilidades pessoais – “Eu sou capaz”;
- Forte percepção sobre sua importância nas relações primárias – “Eu contribuo de maneira significativa e sou genuinamente necessário”;
- Forte percepção de seu poder ou influência pessoal sobre a própria vida – “Eu posso influenciar as coisas que acontecem comigo”;
- Forte habilidade intrapessoal: conseguir entender suas próprias emoções e usar esse entendimento para desenvolver autodisciplina e autocontrole;
- Forte habilidade sistêmica: a capacidade de lidar com os limites e consequências da vida cotidiana com responsabilidade, adaptabilidade, flexibilidade e integridade;
- Forte habilidade de avaliação: habilidade de usar a sabedoria para avaliar as situações de acordo com valores apropriados.
Na prática, encontrar o caminho da gentileza e da não-violência é um desafio importante, já que, na maioria dos casos, os familiares relatam histórias pessoais de processos educativos impositivos e violentos, baseados no conceito de “obediência cega”.
Além disso, muitas vezes os sentimentos de culpa, frustração e vergonha por sentirem-se falhando na missão de educar fazem com que os pais demorem a buscar apoio profissional, o que pode levar ao estado de exaustão e desequilíbrio de todo o sistema familiar
Como criar crianças com Disciplina Positiva?
Não existe um manual da disciplina positiva, pois a prática é construída no dia a dia, de acordo com o comportamento da criança e também da família. Então, é importante que mães e pais conheçam as bases desse sistema e, com isso, consigam ajustar suas práticas.
- Reserve um tempo produtivo em família: seja para conversar sobre o dia, para ensinar uma brincadeira, para ver televisão, contar uma história, brincar etc. É necessário criar esses laços;
- Olhe nos olhos: sempre que seu filho vier até você para perguntar algo ou contar alguma coisa, pare o que você estiver fazendo, olhe para ele e preste atenção. Olhe nos olhos do seu filho e deixe claro que você tem interesse no que ele está falando;
- Dê atenção e demonstre afeto em cada interação para que a criança se sinta amada e acolhida, mesmo quando for reprimida por alguma atitude;
- Dê responsabilidades, de forma que ela se sinta parte importante da rotina. Isso também desenvolve a empatia e autonomia, de forma que suas atitudes têm impacto no bem-estar de todas as pessoas;
- Deixe os limites claros, de forma clara sobre tudo aquilo que se espera da criança. Muitas vezes, o mau comportamento é fruto da dificuldade em saber até onde ela pode ir. Então, fica bem mais simples cobrar as responsabilidades quando elas estão bem definidas para a criança e para a família.
- Mostre empatia: seja franco e diga à criança o que você percebe que ela está sentindo e que você entende esse sentimento. Use exemplos pessoais para garantir essa aproximação.
- Encoraje: você pode auxiliar a criança a pensar em alternativas para melhorar seu desempenho na escola, por exemplo. Deixe a criança dar ideias. Se elas não virem espontaneamente, sugira opções para que vocês decidam juntos.
- Use a brincadeira para ensinar: a criança não come? Que tal pensar em uma brincadeira que envolva comidas, frutas e verduras? Planejar um piquenique saudável, brincar de dar comidinhas para bonecas, bichinhos de pelúcia ou dinossauros. Brincar baseando-se nas cores dos alimentos também pode ser legal. Sempre existem tarefas seguras e divertidas que podem se transformar em estímulos de contato com os alimentos.
Erros que pais e cuidadores cometem ao criar seus filhos
Todos pais e mães desejam o melhor para a seus filhos, mas erros são cometidos, o que não significa que esses pais sejam ruins ou que não amem seus filhos. Porém, mesmo com as melhores das intenções, algumas técnicas tradicionalmente usadas na educação de crianças podem gerar efeitos emocionais negativos além de serem ineficientes e algumas vezes até gerar o efeito contrário ao desejado.
Por isso algumas coisas não devem ser feitas, como:
- Não gritar ou falar coisas que possam agredir emocionalmente a criança: isso faz com que se crie um ambiente ainda maior de resistência da criança, gerando mais conflito. A disciplina e o respeito não são construídos por meio de gritos que podem, inclusive, machucar emocionalmente a criança;
- Não ignore a criança: quando a criança está conversando ou mostrando algo, é importante que seja ouvida para que não gera sentimentos negativos nela. Nem sempre isso é possível, por exemplo, no meio da uma atividade importante, mas busque o diálogo para explicar que o momento não é oportuno, mostrando interesse sobre o que ela para mostrar ou dizer;
- Não ameace ou faça chantagens: muitas vezes, a ameaça vem em forma de tentativa de um bom comportamento, como “se não arrumar o quarto vai ficar sem brincar”. Isso faz com que os sentimentos de frustração sejam ainda maiores. Em vez disso, opte pelo diálogo, reforçando que a criança é responsável pelos seus atos e precisa colaborar.
- Não compare: entenda que cada criança é única e fazer comparações só vai magoá-la e torná-la competitiva.
Por que usar Disciplina Positiva?
Se você ainda não está convencido sobre o uso de disciplina positiva como um método eficiente e afetuoso, aqui vão algumas razões para que você adote essa ferramenta. A disciplina positiva tem como principais benefícios:
- Adequação ao comportamento infantil;
- Desenvolvimento de autonomia e responsabilidade na criança;
- Melhora a autoestima infantil;
- Desenvolve habilidade de resolução de conflitos e negociação;
- Melhora da qualidade da relação e do tempo em família;
- Desenvolvimento afetivo e socioemocional e promoção de autoconhecimento.
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- Dreikurs, Rudolf . Children: The Challenge gives the key to parents who seek to build trust and love in their families, and raise happier, healthier, and better behaved children. Plume Books; Reissue edição (26 dezembro 1991)
- Nelsen, Jane .Disciplina positiva: O guia clássico para pais e professores que desejam ajudar as crianças a desenvolver autodisciplina, responsabilidade, cooperação e habilidades para resolver problemas. Editora Manole; Edição revisada e atualizada (25 fevereiro 2015)